Há 12 anos terminava "Alma Gêmea", um sublime mosaico de símbolos espiritualistas
No fim da história, Rafael e Serena seguem em direção à eternidade. Foto: reprodução. |
Ambientada na
fictícia Roseiral dos anos 40 (após uma primeira fase, na década de 20), Alma Gêmea já mostrava sua carga
simbólica no nome da cidade – uma alusão ao ícone máximo da narrativa: a rosa.
Vermelhas, brancas e azuis, essas flores eram onipresentes ao longo da história
(e fora dela também – basta lembrarmos da abertura da novela: rosas que se
fundem ao som de uma conhecida canção de Fábio Júnior).
Já no início da
história, Rafael (Eduardo Moscovis) cria uma nova espécie para personificar seu
amor pela delicada Luna (Liliana Castro) – rosas são, desde tempos imemoriais,
símbolos do amor, da pureza e da paixão. Com a trágica morte da bailarina, contudo, o
botânico destrói todas as mudas, deixando apenas um único exemplar em sua
estufa.
No ateliê de Luna (retratada no quadro), Rafael e Serena (a reencarnação de sua antiga esposa) trocam carinhos. Foto: reprodução. |
Vale sublinhar a cena
em que a índia mestiça nasce: numa noite de plenilúnio, a alma da bailarina morta se
transforma num corpo celeste e cruza a escuridão dos céus, caindo numa cabana
feita com folhas de palmeira. Ali, ao pé de uma cachoeira, Jacira dá à luz uma
menina indígena de olhos claros (herança do pai garimpeiro). Nota-se uma forte
alusão à alquimia de Paracelso nesse momento mágico. Ele dizia que a alma
humana é feita do mesmo material de que são feitas as estrelas – exatamente como
demonstrou a sequência da morte e retorno de Luna.
Durante todo o trajeto
de Serena, vemos vestígios do místico e do fantástico. Quando deixou sua terra
natal, por exemplo, e partiu para a cidade grande, com sua trouxa de roupas, ela é acolhida por Terê
(David Lucas) e seu inseparável companheiro, o cachorro Jolie. Ambos nos remetem à carta O Louco do Tarô de Rider Waite.
As sessões de
hipnose, regressões a vidas passadas ou os espíritos obsessores que
atormentavam Alexandra (Nívea Stelmann) também conferiam à trama uma dose de
espiritualismo dos séculos XIX e XX. Nesses momentos da história, vimos entrar
em cena uma mescla do espiritismo de Kardec com a teosofia de Helena Blavatsky
e o racionalismo cristão de Luiz de Mattos.
Para encerar a
jornada de Rafael e Serena – e evidentemente de toda a novela –, tivemos a
morte dos dois, juntos, abraçados, como Píramo e Tisbe, como Romeu e Julieta.
Em seguida, na gruta em que Serena via a rosa branca, os protagonistas têm suas
faces alteradas, indicando as diversas identidades que tiveram ao longo das
múltiplas existências. Não por acaso, transformam-se (novamente) em uma única
estrela (metáfora da iluminação espiritual e da plenitude).
A consumação do pacto fáustico: Cristina consegue as jóias da prima, mas é levada para o submundo por uma força maligna. Foto: Telenovelas BR. |
Nesse findar da
narrativa, também acompanhamos a consumação do pacto fáustico de Cristina
(Flávia Alessandra), a grande vilã da história. Depois de arquitetar a morte da
própria prima e recorrer até mesmo aos sortilégios de uma feiticeira, a megera,
que vendeu sua alma ao Diabo em troca do amor de um homem, tem sua dívida
cobrada. Numa forma similar a uma salamandra (ser alquímico e cabalístico que
rege o fogo), o Mal arrasta Cristina para dentro do espelho (artefato mágico e
encantado, portal para tantas e tantas dimensões).
Quinze anos depois,
Terê (agora Ângelo Paes Leme), o amigo de Serena, lança um romance chamado Alma Gêmea, que conta a história de sua
mãe adotiva. Ao terminar o discurso, o jovem escritor deixa uma mensagem
espiritual olhando em nossa direção. Em seguida, já em 2006, descobrimos que
Rafael e Serena voltaram a se encontrar numa nova vida. Posteriormente, a bola
com a qual brincavam se torna uma rosa vermelha. Ao lado, surge a frase de
Harvey Spencer Lewis.
De modo cíclico, como
a figura do Ouruboros, a novela saiu de cena unindo seus derradeiros fios aos primeiros que foram tecidos (o livro que aparece no início e no fim é uma
evidência do texto coerente). Passados 12 anos de seu término, a novela ainda é lembrada como um dos melhores programas da década. Nada mais justo. Que a dramaturgia e a literatura sejam sempre apreciadas, rememoradas
e discutidas. Busquemos reminiscências de espiritualidade em todos os recantos da ficção. Afinal, como anunciou Spencer Lewis: “É na experiência da vida
que o homem evolui”.
É maravilhosamente, perfeito e é uma das Novelas que Amo e não canso de assistir, jamais!!
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