Morte e arte: pilares da obra de Lygia Bojunga Nunes

Lygia Bojunga foi a primeira autora da América Latina a ganhar o renomado Hans Christian Andersen, prêmio – internacional – concedido aos melhores autores de literatura infantojuvenil. Com mais de 20 livros publicados, Bojunga passeou por diversos temas – inclusive os mais nevrálgicos – que povoam o imaginário juvenil. Apesar dos vários personagens, situações diversificadas e cenários distintos, a obra da escritora pelotense recorre – frequentemente – a dois temas fascinantes: a morte e a arte.

A autora Lygia Bojunga Nunes
                 Fonte: Casa Lygia Bojunga
Já em seu livro de estreia – Os Colegas –, publicado em 1972, Lygia, apesar de não evocar a morte, construiu uma narrativa conduzida pela arte musical.  A trama – cujo enredo lembra a longínqua história Os Músicos de Bremen, dos irmãos Grimm, e Os Saltimbancos, de Chico Buarque –, tem a música como papel central. É quando os animais se descobrem artistas que eles encontram a felicidade.

Em Angélica (1975), obra posterior a Os Colegas, a protagonista – que possui o mesmo nome do livro – é apaixonada por teatro. Na obra Corda Bamba (1979), a personagem Maria é uma artista circense. Já Raquel, a personagem principal de A Bolsa Amarela (1976), é escritora. Em O Meu Amigo Pintor (1987) – como o próprio título sugere – também apresenta um personagem artista.

No entanto, em A Troca e a Tarefa, conto do livro Tchau (1984), é que notamos, nitidamente, a união da arte com outro elemento marcante da obra de Lygia Bojunga – a morte.


De fato: eu gostava muito de brincar de morte. Ou melhor, com a Morte.
- Lygia Bojunga Nunes 

A protagonista desse conto é uma garota que é apaixonada pelo namorado da própria irmã – e fica frustrada por isso. Mas além desse episódio, a personagem carrega diversas perturbações. E, num determinado momento da história, descobre que suas angústias devem se materializar em textos. Cada emoção, cada medo, cada tristeza deve se metamorfosear em palavra. A protagonista de A Troca e a Tarefa, para exorcizar seus sentimentos, torna-se, então, escritora.

É aí que a Morte – com inicial maiúscula mesmo, já que, para Lygia, ela é sempre uma personagem – entra na história. A jovem descobre – por meio de um sonho – que morreria assim que colocasse o ponto final no seu vigésimo sétimo livro.

Nada de admirar, então, que, desde pequena, eu me empenhasse tanto em “ficar amiga da Morte”.

- Lygia Bojunga Nunes

Mas não é só A Troca e Tarefa que explora esse tema mórbido. Do mesmo modo que a arte foi utilizada nas diversas obras de Bojunga, a Morte também fulgura no enredo de O Sofá Estampado (1980). E atravessa as páginas de O Abraço (1995) e Nós Três (1987) – obras que a própria autora nomeou de “meu par sombrio”.

Para Lygia - por incrível que pareça -, esse tema é capaz de despertar otimismo em seus leitores: “(...) no futuro, caso a Morte se faça outra vez presente na minha escrita, que ela apareça como nos meus outros livros, que não ‘o par’: deixando brechas para a esperança e a valorização da vida”. 

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