"A bruxa de abril", uma leitura agradável também para o fim de outubro
Bola de cristal, de Waterhouse. Como as figuras desse artista, Cecy é leve, etérea e encantadora. |
Gosto
de bruxas. Sempre gostei. Sem elas, as histórias perderiam a graça e a magia
que até hoje nos encantam. Nos filmes, nos desenhos animados e nas ilustrações
dos livros, a bruxa é uma figura que me arrebata sobremaneira. Geralmente marginalizada,
má e feia, essa personagem arquetípica sucumbe no purgatório das criaturas malditas
imortalizadas pela literatura. Inclusive, por meio dessa arte, conheci muitas bruxas
na infância. Todavia, a mais bela delas (sim, bruxas são lindas) cruzou o meu caminho
na adolescência – Cecy, uma criação de Ray Bradbury.
Com
o poder de se mover entre os corpos dos seres vivos, a bruxa de abril se
entrega a primaveras, ventos e chuvas. Pode enxergar pelos olhos de um felino
ou de um sapo. Pode viver numa gota d’água ou ocupar uma alma que não é sua. Contudo,
Cecy tem um desejo maior – quer amar e ser amada.
É
por isso que ela invade o corpo de Ann, por quem Tom nutre uma profunda
admiração. A moça não retribui o sentimento do rapaz. Mas quando é possuída por
Cecy, entra em conflito. A bruxa peleja contra a mente de Ann e consegue
arrastar a garota para um baile com Tom.
Capa de uma edição recente do livro. Foto: reprodução. |
Nitidamente,
o embate entre as duas naturezas é o mote do conto. Bruxas manipulam o destino
dos homens há milênios – basta observar Circe, na mitologia grega; a Rainha Má,
da história da Branca de Neve; ou a Fada Malvada (eufemismo para “bruxa”), de A Bela Adormecida. Cecy, entretanto, manipula
apenas para ser feliz. Não há maldade em seu coração, apenas um desejo latente
de ser livre. E, para ela, o caminho da alegria e da liberdade é o amor. Sim, as
bruxas também amam!
O
enredo é simples. Mas as descrições de Bradbury provocam um frescor indescritível. É como se nós mesmos nos transportássemos com a agradável bruxinha de abril para
o interior de cachoeiras, gotas de orvalhos e plantas.
Cheia
de metáforas, essa narrativa nos faz pensar sobre diferenças, inconformismo e
solidão. Os anseios de Cecy, uma bruxa, são tão humanos que cativam pela
beleza. Já nas primeiras linhas, ela revela o seu – e meu – grande desejo de
onipresença e imortalidade: “Nesta noite, quero estar em todos os seres do
mundo”.
Rair, você está de parabéns.
ResponderExcluirTeu espaço é fantástico.